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A Ordem que é o Bastonário

por Tiago Moreira Ramalho, em 09.05.13

O Partido Socialista apresentou um projecto de lei para que pudesse haver co-adopção em Portugal. Não tendo especiais convicções sobre o assunto (de vez em quando é salutar reconhecer a nossa própria ignorância), parece-me que a proposta é de elementar bom-senso, atendendo à justificação dada. Aliás, o preâmbulo, apesar de algum excesso de pathos, é assaz persuasivo: «basta imaginar uma criança, educada por dois homens casados, até aos 10 anos de idade, morrendo nessa data o pai biológico num acidente. Aquela criança, que não distingue a nenhum nível qualquer dos pais, não tem, no entanto, o mais ténue vínculo jurídico com o, para si, pai sobrevivente. Pode mesmo vir a ser arrancada dos seus braços pela família do pai falecido, mesmo que não tenha tido qualquer contacto com ela ao longo da sua vida.» Evidentemente, Isilda Pegado considerará que tudo isto é um novo ataque à Família (com «fê» grande). Nada que surpreenda. O que poderá talvez surpreender é o parecer que a Ordem dos Advogados dá ao projecto de lei. Vem no site e deixo aqui um excerto: «O direito da criança a ser adoptada implica que essa adopção se faça em respeito pelo princípio da família natural, ou seja, por uma família constituída por um pai (homem) e uma mãe (mulher) e não com um homem a fazer de mãe ou com uma mulher a fazer de pai.» Não há muita diferença no conteúdo entre isto e o que disse Marinho Pinto em 2010: «Uma criança cuja vida foi atingida por uma tragédia que lhe destruiu a família, tem direito a ter uma família o mais próximo possível da sua família natural, e não um homem a fazer de mãe ou uma mulher a fazer de pai», a não ser no facto de uma coisa são os vómitos tornados públicos do dr. Marinho Pinto e uma outra coisa bem distinta são os pareceres jurídicos da Ordem dos Advogados. Ao primeiro, admitimos tudo, porque é gordinho e bonacheirão, divertido, mesmo quando tonto. À segunda não podemos admitir tanto. Ao oficializar uma visão quase caricatural das relações entre homossexuais, com homens a fazer de mãe e mulheres a fazer de pai, a Ordem dos Advogados, que, pela sua natureza, representa (e, mais que isso, possibilita) a classe, achincalha um grupo de pessoas relativamente às quais deveria assumir uma postura neutra. Quando coloca estas famílias no campo oposto da «família natural», mergulha apenas na acostumada estreiteza mental. Não sei se se tratou isto de uma apropriação por parte do dr. Marinho Pinto de um parecer para fazer vingar aquilo que é a sua opinião pessoal, ou se é esta, realmente, a visão da Ordem. No entanto, é de estranhar que uma declaração do sr. Bastonário feita a um jornal há 2 anos esteja, ipsis verbis, contida num documento oficial da instituição (pública) a que preside. 

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publicado às 15:50


Oui

por Tiago Moreira Ramalho, em 23.04.13

O parlamento francês aprovou a coisa.

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publicado às 16:37


Bichas histéricas

por Tiago Moreira Ramalho, em 22.04.13

Os franceses estão, de um modo geral, arreliados. Há o presidente tosquinho, há o desemprego, há a comum chatice dos dias e, em cima de tudo isso, floreia colorida a questão gay. Esta semana vai ser votada a proposta que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo e as ruas de Paris andam movimentadíssimas. Têm vindo passear, logo aos milhões (palavra: as organizações dos respectivos movimentos falam em mais de um milhão de participantes em cada manifestação), uns a favor, outros contra, numa rebaldaria. Ontem, dia do descanso familiar, vieram de novo, em números mais modestos (parece que faltaram as carreiras a ir buscar gente ao Plomb du Cantal e arredores). A França, dizem todos, está com uma crise de valores. Fala-se mesmo em infanticídio em massa («Vous êtes en train de assassiner des enfants», alertou, visivelmente transtornado, o senhor Philippe Cochet, da UMP). Tudo, no fundo, muito triste, mas expectável. Ainda que não sejam considerados pináculos de masculinidade (pelo menos os homens), os franceses sempre foram caninos na defesa da saúde das suas fêmeas. Mesmo os movimentos de esquerda mantiveram considerável «desconfiança» (chamemos-lhe assim) face às frentes revolucionárias dos pédés. A Manière de Voir, numa edição de 2011 sobre revoluções (de toda a espécie), relata mesmo um episódio curioso. O Partido Comunista Francês, na sua posição oficial, dizia, em 1972, que «la couverture de l’homossexualité ou de la drogue n’a jamais rien eu à voir avec le mouvement ouvrier». Misturar homossexualidade e drogas era, acredite-se, o lado brando do PCF. Um antigo candidato presidencial do partido, Jacques Duclos, chegou mesmo, quando questionado por um activista sobre a existência de revisões à posição oficial, a responder algo como: «Comment vous, pédérastes, avez-vous le culot de venir nous poser des questions? Allez-vous faire soigner. Les femmes françaises sont saines; le PCF est sain; les hommes sont faits pour aimer les femmes.» Ignoro se o activista, depois de tão incisiva lição sobre os factos da vida, deixou de dormir com homens. Era essa a vontade do sr. Duclos. Tal como será, muito provavelmente, a vontade do sr. Cochet – o equivalente, nas alas mais à direita do parlamento francês, a uma bicha histérica. Deles e de muitos outros: em Lille e em Bordéus já houve ataques armados a bares gays (sim, porque isto não tem – nunca tem – nada que ver como homofobia; a gente só tem mesmo muito rigor semântico no respeitante ao casamento). No fim, resta esperar que o parlamento francês tenha «le culot» de, amanhã, fazer o que está certo.

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publicado às 11:50





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